sábado, 2 de novembro de 2013

Alterações de Évora e exércitos espanhóis


   Cõstava este exercito de Cãtâbria, de varios terços de Infãtaria Castelhana, quasi toda forçada para [A85] a guerra; a qual entre a aspereza dos montes de Guepúzcua, agora detida dos frios, agora dificultada do aperto dos passos, se conservava, mas sempre com vivo desejo de liberdade. Estimavase seu numero, dentro dos quarteis, em oito mil Infantes, que marchando soltos, e por terras largas, e conhecidas, se diminuìrão de sorte, que antes de arribarem â Estremadura, erão menos de quatro mil, e menos os que chegàrão ao novo alojamento. A mais rigurosa parte de aquellas armas, consistia em hum Regimento de Dragoens: nova milicia entre nós, e que de Alemanha trouxera a seu cargo Dom Pedro de Santa Cizilia, de quem no livro primeiro de nossa Catalunha, fazemos particular menção. Foi nomeado por General deste exercito, o Duque de Bejar, moço de desasete annos; havendose sua riqueza, e estado por suficiencia, disserão: Que por ser o mayor senhor da Estremadura, donde o exercito se juntava, lhe competia o posto[…]

   Mas como já no Reyno do Algarve, mostrava para revolverse mayores designios, foi tãbem mayor o cuidado de se lhe aplicar o remedio; porque os portos, de q aquelle Reyno he abũdante, causavão muyto mais receyo, que suas proprias forças. Por esta razão se ordenou, que o Duque de Medina Sidonia, Capitão General da Andaluzia, ajuntasse da gente de seu cargo, atè seis mil Infantes, e com os ginetes da costa, e alguns voluntarios, formasse outro exercito, com q se avesinhasse ao Algarve.

   O rei Filipe IV de Espanha, terceiro de Portugal estava a braços com várias guerras na Europa e no mundo, Países Baixos, Inglaterra, França e corsários, piratas, contrabandistas, com as remessas de prata do Perú a diminuírem, gastos da monarquia cada vez maiores e resolve, a conselho ou por ordem do seu valido, o Conde-Duque de Olivares, aumentar ainda mais os impostos. Os do reino de Castela já não aguentavam mais, já tinha havido até uma revolta popular no País Basco, a população até diminuía com a fome. Os súbditos dos outros reinos (Aragão, Portugal …)  entendiam que não deveriam financiar as guerras de Castela, invocando as suas leis e autonomia. E, no entanto, os impostos aumentavam e os recrutamentos militares também.

   Depois de outros motins é a vez da grande revolta popular de Évora que se estende pelo Alentejo, Algarve e Beiras: As alterações de Évora, também conhecidas por revolta do Manuelinho..
D. Francisco Manuel de Melo vem ao serviço do rei a Évora e descreve, tal como Severim de Faria os acontecimentos e o contexto.

   O Conde-Duque não confiava muito nos portugueses e por isso envia exércitos espanhóis, apesar da nobreza portuguesa não ter participado nos acontecimentos, opondo-se até aos vis populares, tal como D. João, Duque de Bragança, rei a partir de 1640. É interessante que um dos exércitos, que sai da Andaluzia é comandado pelo Duque de Medina Sidónia, da família Guzman, irmão de D. Luísa de Gusmão e cunhado de D. João, que anos mais tarde haveria de tentar uma conspiração para a separação da Andaluzia, com o apoio do rei de Portugal, que foi paga com a morte do Marquês de Ayamonte (também Guzman), por ordem do Conde- Duque (também Guzman).
O outro exército, não fosse os crimes cometidos, quase caía no ridículo. Segundo o cronista, saí da Cantábria e País Basco com 8000 homens a pé (imagine-se atravessar a Espanha, quase sem estradas) e chega à fronteira portuguesa com apenas 4000, isto é cerca de metade teriam desertado. Ainda por cima é comandado por um rapaz de 17 anos, porque era da família mais importante da Extremadura.

Nota: sublinhados nossos. Ver também texto de Severim de Faria sobre Alterações de Évora

Textos de D. FRANCISCO MANUEL DE MELO, EPANÁFORAS DE VÁRIA HISTÓRIA PORTUGUESA, EDIÇÃO SEMIDIPLOMÁTICA, POR EVELINA VERDELHO, CENTRO DE ESTUDOS DE LINGUÍSTICA GERAL E APLICADA (CELGA) FACULDADE DE LETRAS, UNIVERSIDADE DE COIMBRA, 2007

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