quinta-feira, 29 de abril de 2010

Hino de Riego. Hino da revolução liberal e da República Espanhola

Agora que em Espanha a extrema-direita, a começar pela Falange (porque é que ainda existe?), pretende silenciar o juiz Baltazar Garzon e, sobretudo a memória das centenas de milhares de pessoas fuziladas, bombardeadas, torturadas, durante e após a guerra civil (1936-39), recordemos que a Espanha já teve outro Hino Nacional, oficial após a revolução liberal de 1820 (no mesmo ano que a portuguesa) e durante a 2ª República (1931-39):
O Hino de Riego

Encontrei também, por acaso, uma busto de homenagem ao general liberal Riego, em Oviedo.

sábado, 17 de abril de 2010

D. Pedro, Um herói romântico.


Agora que se comemora a República, que se fez contra a monarquia, mas também pela Regeneração de Portugal e pelos ideais de cidadania, lembremos que algumas dessas ideias já existiam antes, com formas e práticas, obviamente diferentes.
D. Pedro foi uma figura singular e contraditória. Não sei porque é que em Portugal ou no Brasil não se fez um filme a sério sobre esta figura. Talvez tenha faltado aqui um Visconti para retratar toda esta comédia e tragédia. Os ingredientes dessa história pessoal, familiar e nacional (ais) poderiam dar imensas ou inúmeras obras, onde não falta o drama, a intriga e o clímax.
Neto de uma rainha que ensandeceu e que chegou ao Brasil com uma corte com senhoras carecas, devido à praga de piolhos, situação que em S. Salvador da Bahia de Todos os Santos (grandes nomes, um pouco como o da Cidade do Santo Nome de Deus de Macau), levou a que as senhoras da elite pensassem que era moda na Europa, até porque nenhum rei ou corte tinha entretanto chegado às Américas. Seu pai, algo compulsivo na arte de comer frangos e de algum aparente desprezo pela política, coisa que muitos portugueses ainda se sentem herdeiros, soube fazer o que os seus parentes espanhóis não conseguiram: preservar o trono. Aqueles, ao contrário deixaram-se prender por Napoleão, que os substituiu por um seu irmão. Entretanto a única da família Bourbon que escapou tornou-se rainha de Portugal, D. Carlota Joaquina, mãe de D. Pedro e D. Miguel, havendo até quem a quisesse para rainha de Espanha ou até para rainha para os lados do rio da Prata. Só que ela não gostava de liberais argentinos, nem da América em geral, nem do marido, que em troca lhe chamava megera. D. João VI ou os seus ministros, entretanto aproveitaram para alargar o Brasil, conquistando terras aos espanhóis ou ao que restava deles, a província Cisplatina, hoje chamada Uruguai e investindo também na Guiana Francesa, alargando a Amazónia. Por cá deixou os portugueses entregues aos franceses e também aos espanhóis, que primeiro aproveitaram e depois se tornaram amigos, se bem que tivessem ficado com Olivença, libertada e depois entregue a Espanha pelos ingleses que ficaram aqui a mandar neste protectorado.
D. Pedro lá foi crescendo no Brasil com o seu irmão D. Miguel, que as más-línguas diziam que era apenas meio-irmão, e talvez pelos calores, talvez por uma tradição herdada de outros seus ascendentes, como D. João V, que gostava de freiras, mas não de uma qualquer, ou de D. José que se interessava pelas Távoras, tendo ainda apanhado um tiro, no coche pelo menos, dizíamos, D. Pedro foi-se interessando pelas senhoras mais jovens, que dado o interesse, também lhe cresciam as respectivas barrigas, em particular a Marquesa de Santos. Não foi tradição que tivesse acabado, pois um seu descendente D. Carlos, também não se esquecia de quase nenhuma, senhora ou criada. O seu irmão, nem tanto, preferia touradas e tradição. Um castiço.
Com a revolução liberal, em 1820, Portugal incendeia-se em entusiasmos liberais e no Brasil também, pelo menos alguns que podiam e não eram escravos.
D. Pedro, educado para ser absolutista, desconfiado dos liberais radicais, mas liberal conservador, proclama a independência, depois de dizer Fico, perante o ultimatum das cortes em Lisboa.
Proclama a independência do Brasil, do alto de um cavalo, em Ipiranga, hoje um bairro de S. Paulo e escreve uma Carta Constitucional para o Brasil. Após a morte do pai, torna-se rei de Portugal, o que não agrada aos portugueses do Brasil, agora brasileiros. Dá o trono a sua filha, D. Maria, visto que o filho mais velho lhe sucederia no Brasil, filha esta que casaria com D. Miguel, depois de jurada a Carta Constitucional, o que este fez, para logo a seguir proclamar o absolutismo.
Depois das perseguições habituais nestas circunstâncias, com o “malhados” (liberais) a serem malhados constantemente, prisões e enforcamentos incluídos, outros a fugiram do país, quando podiam, D. Pedro regressa à frente de voluntários e mercenários, outros que a pouco e pouco vêem que os ventos estão a mudar, e implanta definitivamente o liberalismo, nacionalizando conventos e outros bens, com reformas que mudaram a face do país, se bem que com alguns aproveitamentos particulares e outras guerras e guerrilhas que se seguiriam até meados do século.
D. Pedro foi herói libertador do Brasil, imperador liberal, acusado depois de ditador, abdicou do Império, abdicou do título de rei de Portugal também, fez uma Carta constitucional para o Brasil, fez uma Carta Constitucional para Portugal, como músico que era (à semelhança de D. João IV), fez um hino para o Brasil, outro para Portugal. Morreu novo, como duque de Bragança.
Os hinos das monarquias liberais do Brasil e de Portugal falam também da Liberdade e da Constituição, coisa que os monárquicos miguelistas sempre abominaram.


Alexandre Herculano. Esquecido!?

Este ano seria o das comemorações do nascimento de Alexandre Herculano. Historiador, escritor, um dos "bravos do Mindelo", que participou ao lado de D. Pedro na luta contra o Antigo Regime miguelista, depois de passar por um exílio, visto que o poder absolutista não admitia a cidadania. Lutou pelas suas convicções políticas sempre,até ao seu "exílio" voluntário, em Vale de Lobos, onde se dedicava à agricultura, à História e à Literatura, recusando cargos honoríficos e títulos. Sem ele muitos documentos de arquivos teriam tido um triste fim. Não se preocupou com festarolas constantes nem estardalhaços inúteis, mas fez muito mais por bibliotecas (a da Ajuda, por exemplo), arquivos, pelo património, pela investigação, com um método rigoroso, do que muitos retóricos habituais seus contemporâneos. Tornou-se pessimista dizendo: "quanto mais conheço os homens, mais estimo os animais". Mesmo assim intervinha discretamente; não desistia.  Alguns ainda não lhe perdoaram, querendo remetê-lo para o esquecimento. Usual neste país, onde expor as ideias, discutir e intervir é ainda coisa mal vista, mesmo por alguns (ou algumas) que anunciam revoluções que descobriram há pouco, querendo que todos e todas obedeçam, e com elogios, à sua voz iluminada de comando.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Para dormir?

Três músicas para embalar crianças.
Uma é de Trás-os-Montes, cantada em mirandês, pela Brigada Vítor Jara. O mirandês é falado em Portugal, mas é uma variante do leonês, língua em parte absorvida pelo castelhano, em Espanha. Nela uma mulher canta para o menino mas marca um encontro com o amante junto ao moinho.


Na segunda, que é a mesma, numa versão galega, uma língua falada em Espanha (ou será que é uma variante do português?), fala-se em moinho e menino e não molino ou niño como na portuguesa.


Na última, turca, ou antes de judeus espanhóis, cantada em ladino, também se canta a uma criança (menina). Só que esses judeus sefarditas, não eram apenas do actual estado espanhol: eram também portugueses. Durante séculos castelhanos,catalães, portugueses ... consideravam-se espanhóis, porque eram da Península Ibérica, Espanha ou as Espanhas, Al-Andaluz em árabe, Sefarad em língua judaica. Repare-se que não se diz duerme, como em castelhano, mas durme e escola e não escuela.

sábado, 10 de abril de 2010

A Igreja Católica e os escândalos pedófilos

Dou uma importância relativa a certas explicações que relacionam a Igreja Católica e o celibato dos sacerdotes com a homossexualidade, pedofilia, assédio sexual e outras.
   São coisas diferentes e cada uma merece uma explicação, se a houver, já que o ser humano não é propriamente o “homo sapiens”, antes aproximando-se da definição de “homo demens”. Nem todos, nem a maior parte, certamente. E, em termos de Estado de Direito, teremos que começar com as responsabilidades individuais, sob pena de andarmos a procurar culpas colectivas que podem levar à desresponsabilização, aquilo que na linguagem comum é traduzido como a “culpa morreu solteira”.
    Na história da Igreja Católica há uma obsessão com o sexo, proibido para solteiros, oficializado e permitido com casais heterossexuais, mas regulado incessantemente. Nas igrejas protestantes também, sobretudo entre puritanos ou calvinistas, que transformaram este mundo no crescimento incessante do capitalismo. Muitos muçulmanos e judeus fizeram interdições. Basta ler os Livros, seja a Bíblia, o Alcorão, a Tora e, sobretudo, as práticas. Nem sempre foi assim: mesmo naquilo que chamamos matriz europeia (e não só), nas culturas grega e latina clássicas, o sexo era encarado de modo diferente. Basta visitar Pompeia ou a ilha de Delos para ver que a sexualidade era mais “natural”, do que os séculos que se seguiram.
Não é só na Igreja Católica que há sinais de pedofilia. Entre outros também, mas não relativizemos a questão.
    Um dos problemas, que não explica tudo, é a relação entre um poder não contestado e o sexo, sobretudo com uma moral repressora e a manutenção desse poder que leva a desprezar as vítimas e a esconder os abusos, ainda que com o esquecimento de princípios constantemente apregoados.
    Vejamos o caso da Irlanda. Uma luta secular pela independência e contra o colonialismo inglês e protestante levou a que os irlandeses transferissem parte do seu poder como cidadãos para a Igreja Católica, incontestada assim. Isso permitiu que orfanatos dirigidos por padres pudessem fazer o que queriam com crianças que nunca poderiam exigir nada, nem denunciar nada porque ninguém os ouviria. Como também por cá, como noutros lugares.
    O problema não é a religião mas o poder, os ambientes totalitários, concentracionários, católicos ou outros, que permitem que as vítimas possam ser sujeitas a sevícias várias. Uma ou outra prática ou moral religiosa pode agravar, mas o poder incontestado é que permite situações destas.
   Portanto, procuremos primeiro os indivíduos e depois passemos, sem esquecer, às hierarquias, às conivências e aos silêncios.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Senhora de Aracelis





Nesta capela e sobretudo no espaço circundante, festejam os agricultores dos concelhos de Mértola e Ourique, em finais de Agosto, a divindade da Agricultura. É a senhora de Aracelis, Ara Coelis, o Altar do Céu, como poderia ter sido Ceres, Ísis ou a Deusa-Mãe.

Segundo a lenda dela se avistam mais seis irmãs(os), perfazendo sete, número mágico. Os nomes variam, mas há um relato que me parece mais adequado: são elas S. Barão, Senhora das Neves, Senhora do Amparo ou São Brissos (Veríssimo), no concelho de Mértola, Senhora de Guadalupe, em Serpa, S. Pedro das Cabeças, em Castro Verde.
Cultos antigos que se mantiveram, uns mais ligados à agricultura, outros à pastorícia, como o culto da senhora de Guadalupe, em que pastores encontraram uma Senhora morena (seria árabe, moçárabe?), um santo eremita local que ajudava os casados a terem filhos, S. Barão (o homem), S. Pedro das Cabeças, onde se festeja o milagre e mito fundador da Pátria (batalha de Ourique). Marcam uma região, “os campos brancos”, em grande parte os antigamente chamados Campos de Ourique, uma comunidade, onde se pastoreavam rebanhos, provindos do Norte de Portugal ou de Espanha, na época da transumância

terça-feira, 6 de abril de 2010

Virgen de Piedras Albas. Castillejos, Andaluzia

Domingo de Páscoa. Reencontro das famílias espalhadas por Madrid, Catalunha, por tantos lados. Gente que daqui saiu, porque também aqui o êxodo rural deixou estas terras quase só com alguns velhos.
Vestem-se eles e elas à andaluza, comem e bebem em cima dos cavalos ou a pé, cantam dançam, rezam, disputam os lugares no andor. Seguem a tradição com música de um tamborileiro e dançarinos a preceito.
A senhora triunfa, Cristo é apenas é apenas uma figura pequenina.

Hábitos diferentes

Ontem estive com um casal amigo que vive em Inglaterra. Ela é portuguesa e ele inglês. Vinham acompanhados das filhas, pois estão em férias.
A mais nova está no 11º ano. Tem disciplinas de ciências e humanidades. No final do ano vai para um novo ciclo de estudos, 12º e 13º anos, em que escolherá quatro disciplinas, num ensino mais especializado, antes de entrar na universidade. Depois, poderá entrar ou fazer um ano de voluntariado ou outras actividades, dentro ou fora do país, o que também é tido em consideração por algumas faculdades.
Os professores (penso que um professor-tutor), marcou-lhe 6 horas de estudos diárias, enquanto estivesse nestas “férias”. Não foi preciso ninguém lhe dizer, aqui, que tinha que ir para casa estudar. Foi, porque está habituada, porque os pais a habituaram e porque não põe em causa a recomendação ou ordem do professor para estudar, mesmo não estando ninguém a vigiá-la numa pretensa “escola a tempo inteiro”.

Reflexões sobre o ensino secundário (cursos científico-humanísticos)- 3


Uma disciplina que todos os alunos dos cursos científico-humanísticos têm no seu percurso, ao longo dos três anos, é a disciplina de Português, disciplina fulcral, já que todo o ensino, com excepção óbvia das línguas estrangeiras, é feito na língua materna, contribuindo todas as disciplinas ( e o que se fala e escreve em casa …) para a literacia na língua materna.
O programa em vigor, propõe um diagnóstico inicial no décimo aluno e refere as competências que devem ser avaliadas também no início. Por exemplo:
compreensão oral
. identificar a intenção comunicativa do interlocutor;
. saber escutar e compreender géneros formais e públicos do oral;
. saber escutar criticamente discursos orais, identificando factos, opiniões e enunciados persuasivos.
Ou
expressão escrita
. dominar técnicas fundamentais de escrita compositiva:
- organizar o texto em períodos e parágrafos, exprimindo apropriadamente
os nexos temporais e lógicos;
- escrever com correcção ortográfica, morfológica e sintáctica;
- usar vocabulário apropriado e preciso;
- aplicar correctamente regras básicas da pontuação
Ou ainda:
– funcionamento da língua
. identificar classes e subclasses de palavras;
. reconhecer o valor polissémico das realizações lexicais;
. dominar os paradigmas da flexão nominal, adjectival e verbal;
. identificar modos e tempos verbais em frases simples e complexas;
. reconhecer funções sintácticas nucleares;
. distinguir relações de coordenação e de subordinação.
Uma observação simples, a experiência relatada ou efectuada no terreno, indica que a maior parte dos alunos não atingiram suficientemente estas competências. Mais, os testes internacionais PISA quando medem a literacia (alunos com 15 anos),chegam a conclusões destas, como no PISA, 2001:
[…] cerca de 60% dos jovens de 15 anos no espaço da OCDE são bem sucedidos na realização das tarefas correspondentes a estes três níveis. Mas esta percentagem varia muito de país para país (PISA, 2001, pág. 5)..
Em Portugal, bem assim como no Brasil, na Grécia, na Letónia, no Luxemburgo, no México e na Federação Russa esta percentagem não atinge os 50%.
Se observarmos a distribuição por nível, verificamos que, no nível 5 (o mais elevado) se situam 4% dos estudantes portugueses de 15 anos, contra uma média de 9% no espaço da OCDE. No nível 4 temos 17% dos alunos portugueses, contra uma média de 22% na OCDE. O nível 3 foi atribuído a 27% dos alunos portugueses, em comparação com 29% no espaço da OCDE. No nível 2 o contraste é entre 25% em Portugal e 22% na OCDE.
Finalmente, no nível 1 temos 17% dos nossos alunos, contra a média de 12% no espaço da OCDE.

O recente  relatório da DataAngel Policy Research Incorporated (2009), A dimensão Económica da Literacia em Portugal: uma análise, na página 9, aponta também para conclusões semelhantes ou piores:
Quase um quarto da totalidade dos alunos (24,5%) obteve pontuações de nível 1 ou inferior, enquanto 28,8% obtiveram pontuações de nível 2. As distribuições dos resultados por níveis foram semelhantes nos testes realizados em 2002 e 2003.
Esta tendência é preocupante, porque significa que mais de 50% da actual juventude portuguesa está classificada como pouco qualificada nas disciplinas principais de literacia de leitura, matemática e ciências. Este resultado tem implicações importantes para as perspectivas económicas futuras de Portugal, porque os trabalhadores, com competências inferiores ao nível 3, terão grande dificuldade em competir na economia global do conhecimento. (Pág. 74).
Ora, perante isto chegaremos à conclusão que os programas são irrealistas e não têm em conta os alunos que estão no sistema. Já que em semanas não se recupera o que não se aprendeu antes, há duas soluções que têm sido praticadas: reprovar os alunos, logo no décimo ano ou aprovar administrativamente, acumulando problemas exponencialmente.