quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Poetas perdidos? Bernardim Ribeiro e o Alentejo


Monte do Álamo, Cano

Hesitei em (re,re) publicar esta poesia, porque deveria ser muito mais conhecida.
Mas tenho chegado à conclusão que os alunos do ensino básico e secundário já não têm oportunidade de usufruir destas coisas.
Os programas mandam-lhes fazer relatórios, analisar textos de natureza diversa: contratos, requerimentos, regulamentos, artigos científicos e técnicos (será que ...?), reclamações (será que se habituam?), ... e também textos literários que sejam argumentativos, líricos... Estudam-se autores "a propósito de". Por exemplo, o Padre António Vieira, porque fez textos argumentativos.
A literatura medieval e o seu contexto quase desapareceram, não fosse uma disciplina optativa escolhida por uma minoria: Literatura Portuguesa.
Muitos autores teriam desaparecido, não fosse o bom senso de alguns professores.
Recordo aqui um que vai entrando no rol do esquecimento. Um alentejano, provavelmente do Torrão, entre os séculos XV e XVI. Também refere o abandono, problema actual:

ÉCLOGA II

Dizem que havia um pastor
antre Tejo e Odiana,
que era perdido de amor
per da moça Joana.
Joana patas guardava
pela ribeira do Tejo,
seu pai acerca morava
e o pastor de Alentejo
era, e Jano se chamava.


Quando as fomes grandes foram
que Alentejo foi perdido,
da aldeia que chamam o Torrão
foi este pastor fugido.
Levava um pouco de gado,
que lhe ficou doutro muito
que lhe morreu de cansado;
que Alentejo era enxuito
de água e mui seco de prado.


Toda a terra foi perdida;
no campo do Tejo só
achava o gado guarida:
Ver Alentejo era um dó!
E Jano, pera salvar
o gado que lhe ficou,
foi esta terra buscar;
e, se um cuidado levou,
outro foi ele lá achar.
[…]
Bernardim Ribeiro

Nenhum comentário: